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Link to original content: https://musicnonstop.uol.com.br/dreamville-tomorrowland-brasil/
Do check-in ao after: como foi acampar no Tomorrowland Brasil
Tomorrowland Brasil - Dreamville Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Do check-in ao after: como foi acampar no Tomorrowland Brasil

Vitória Zane
Por Vitória Zane

Em forma de diário, Vitória Zane conta em detalhes a experiência no Dreamville, o acampamento oficial do festival

O Tomorrowland Brasil realizou sua quarta edição no país com sucesso. Em Itu, interior de São Paulo, o festival se estabeleceu novamente no Parque Maeda, atraindo mais de 150 mil pessoas ao som de mais de 150 DJs e produtores. Mas o que poucos sabem é que o festival tem um espaço para camping chamado Dreamville, que recebeu mais de dez mil pessoas neste ano.

A prática de acampar em festivais não é muito comum na cena mainstream no Brasil. O Tomorrowland é o único festival comercial aqui no país a oferecer uma área de acampamento. Mas mundo afora, é uma prática mais comum em grandes eventos de todas as sonoridades, como Glastonbury (Reino Unido), Coachella (Estados Unidos), Awakenings (Holanda), Wacken Open Air (Alemanha) e muitos outros. 

O Music Non Stop foi aos três dias da edição de 2023, mas estava intrigado para entender como funcionava o Dreamville, uma verdadeira cidade dentro do festival, somente acessível para os campistas. Então, escalou um trio para viver de perto toda essa experiência, formado por mim, Vitória Zane, pelo Thiago Kawakami e pela Tatiane Silvestroni. Juntando nossas forças em textos, vídeos e fotos, surgiu a cobertura de uma das maiores aventuras das nossas vidas.

Com pouco tempo para preparação, fomos consumindo todos os conteúdos possíveis sobre o acampamento que encontrávamos na internet. Em meio a ansiedade de experimentar essa acomodação e o nervosismo de uma experiência inédita, fizemos compras, arrumamos malas e traçamos nosso roteiro pelo Tomorrowland Brasil.

Vitória Zane, Thiago Kawakami e Tati Silvestroni. Foto: Music Non Stop

Efetivamente, tudo começou quinta-feira, 10, quando o festival tinha início apenas para os acampados. O dia estava nublado, mas o sol apareceu com tudo às 11h, enquanto o Dreamville abria suas portas para o People of Tomorrow, e eu, atrasada como sempre, ainda estava guardando as malas no carro. Última checagem para ver se não tinha esquecido nada (spoiler: esqueci) e uma parada já adicionada no GPS para ir à farmácia (sim, melhor garantir o remédio para dor de cabeça, dor no corpo, azia…).

Rumo a Itu, um fervilhar de ideias passando pelas nossas mentes. Paramos no hotel para fazermos o credenciamento de imprensa e partimos para o último compromisso antes de entrar para a magia do festival. Participamos da inauguração da Tomorrowland Foundation, uma escola de música e artes para crianças e adolescentes na cidade, e já envoltos pela atmosfera de união que paira sobre as ações da marca, seguimos ao Parque Maeda, onde chegamos por volta das 17h30.

Estacionamento lotado, descarregamos as malas e fomos estacionar bem longe da entrada, onde havia vaga, afinal, a maioria já tinha chegado ao evento. E aí começou a saga de levar toda a bagagem (composta por mala com roupas, sapatos e itens de higiene; cobertores e travesseiros; cooler com alguns alimentos e água; notebook e afins). Mesmo com a temperatura mais amena do final da tarde, suamos. Era bastante peso e um caminho longo para percorrer. Resolvemos fazer em duas viagens (enquanto dois levavam algumas malas, outro ficava guardando as que restavam). Passamos pela revista de segurança e seguimos por um caminho composto de easy floor até a nossa acomodação, que era a Spetacular Easy Tent. Vale dizer que esse trajeto era cheio de funcionários que diziam “bem-vindo ao Tomorrowland” e usavam uma placa com a frase “happy to help”

Tomorrowland Brasil - Dreamville

Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Após o check-in, fomos informados sobre o número da barraca e a rua (as ruas eram organizadas por ordem alfabética e tinham nome de frutas). A nossa era a Damasco, bem embaixo de uma bela árvore. Logo de cara, encontramos vários amigos que estavam no mesmo local. Por sorte, eles viram nosso cansaço e nos emprestaram um carrinho, que serviu para voltarmos à entrada e buscarmos o restante das malas. Feito todo esse processo, os funcionários nos levam até a barraca, que está lacrada, e lá mesmo quebram o lacre e nos mostram todo o interior dela, que contém um colchão de ar, uma lamparina, um cadeado, um espelho e dois sacos de dormir. Essa modalidade do Dreamville também inclui tomada, o que foi imprescindível para nossa estadia. O céu escuro da noite nos atrapalhou de início: precisávamos acomodar nossos pertences e não dava para enxergar tanto assim no meio da grama. Conseguimos com ajuda da lanterna do celular e logo em seguida fomos surpreendidos pela chuva que acabava de chegar. 

Mas calma aí, pra gente não tem tempo ruim, não! Trancamos a barraca, vestimos nossas capas e fomos dar uma olhada pelo espaço. Estávamos próximos aos banheiros e ao info point. Queríamos ver os shows no The Gathering, a festa de boas-vindas aos campistas, mas a fome falava mais alto. Afinal, não tínhamos almoçado e era perto das 20h. Ao lado dos palcos, uma quantidade enorme de boxes com várias opções de alimentação e bebidas, desde pastel (o mais barato do cardápio) até crepe francês, batata-frita, pizza e hamburguer (nosso escolhido, que valeu muito a pena!). Todas as compras dentro do festival são feitas na moeda do Tomorrowland, a pearl. Uma unidade é equivalente a R$ 9,00, e a média dos valores de alimentação ficava entre quatro a cinco pearls, ou seja, de R$ 36,00 a R$ 45,00.

Mesmo embaixo de chuva, a atmosfera era admirável. Pessoas de inúmeras nacionalidades dividindo as mesmas experiências. Todas animadas, ansiosas e, sobretudo, felizes por estarem ali. E vou te contar, viu? A quantidade de pessoas falando em espanhol era absurda. Isso traz um tom muito legal para a experiência de acampar, pois é possível esbarrar com pessoas de inúmeros outros países.

O palco The Gathering. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Com o cansaço vencendo a energia, fomos escovar os dentes e dormir. A primeira noite numa barraca na vida (não, eu nunca tinha acampado antes) foi mais fácil do que pensava. Não foi ruim deitar no colchão de ar, e o saco de dormir dava conta do frio que estava no Parque Maeda. Ventava, e o som da chuva se misturava ao som das pessoas conversando e ouvindo música. Afinal, o rolê não acabava com o encerramento dos palcos: basicamente, todos os dias eram realizados “afters” pelo Dreamville, e sempre tinha alguém passando com uma caixa de som com volume alto. E sim, era sempre música eletrônica. No primeiro dia, acabamos precisando de um tempinho para nos adaptarmos. Você está num ambiente diferente, longe de casa, entendendo o funcionamento da barraca e do camping pela primeira vez, e ao deitar a cabeça no travesseiro, precisa lidar com música alta e conversas ao redor do seu espaço. Mas nada disso foi um grande problema para nós.

No dia seguinte, sexta-feira, 11, já acordamos com a notícia de que os banhos estavam disponíveis das 08h às 20h. E, claro, foi a primeira coisa que fizemos. Tivemos a sorte da sombra da árvore ajudar a não deixar nossa barraca tão quente, mas chega um momento que você quer e precisa sair de dentro dela para tomar um ar. Descemos e pegamos a fila para tomar banho. Escolhemos iniciar a saga naqueles da estrutura de alvenaria, próprios do Parque Maeda. Ficamos cerca de 15 minutos aguardando e, enfim, liberados para passar aquele momento tão aguardado embaixo d’água.

Mas calma, se você pensa que pudemos ficar lá um tempão deixando só a água escorrer, está enganado! Os banhos devem durar, no máximo, quatro minutos — e todos os chuveiros contavam com um timer que iniciava uma contagem regressiva assim que você clicasse nele. Aprendemos na marra que deveríamos ter treinado em casa antes. Por sorte, poderíamos dar algumas pausas na água, que eram imprescindíveis para conseguir se ensaboar. Confesso que nessa primeira vez foi difícil conseguir lavar o cabelo (ficaram resquícios de condicionador), e não tinha suporte para colocar o sabonete, o que me obrigou a deixar minha saboneteira no chão (enquanto travava uma luta comigo mesma por não querer fazer isso). 

Vale lembrar que os banhos eram pagos, ok? Só estavam incluídos para quem adquiriu a modalidade Supreme Easy Tent ou Grande Easy Tent. Eles custavam 2,25 pearls, o que era, aproximadamente, R$ 20,25 cada. Por conta do valor, muitas pessoas optaram por não tomar banho, mas isso fica mais pra frente.

Outra coisa muito legal é entender o cuidado e o carinho como as pessoas tratam umas às outras. Realmente é como uma irmandade, difícil de explicar. O senso de comunidade fala alto. Isso tanto para quem está frequentando como público quanto para os funcionários. Toda manhã e madrugada eles passavam pelas ruas com bombas de ar para ver se o colchão havia esvaziado. Também estavam a todo momento nos lockers, armários que você pode comprar para guardar coisas que sejam importantes ou que não couberam na barraca.

De volta, improvisamos um varal para estender as toalhas e tomamos nosso café da manhã no jardim (olha que fofo!), junto com as demais pessoas acampadas na nossa rua. Cada um pôde levar cinco alimentos fechados, 12 garrafas plásticas de água, 12 latas de bebida não alcoólica e 12 latas de cerveja (todas de até 500ml). Sendo assim, é possível economizar um pouco levando alimentos e bebidas industrializadas de fora para dentro do Dreamville. Ah, você também pode sair de carro e voltar todos os dias, graças ao adesivo que é colado no veículo ao chegar no local.

Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

A vibe é tão boa no Dreamville que o tempo passa muito rápido. Quando vimos, já estava próximo do horário de início do festival para o público geral: 13h. Nos arrumamos dentro da barraca, o que é bem fácil: há espaço de sobra e você consegue ficar em pé, basta fazer uma espécie de Tetris para colocar todos os seus pertences no lugar, e seguimos para curtir e trabalhar nas 12 horas do festival.

Retornamos assim que o último show acabou (mas quem está acampado pode entrar e sair da área do camping para a área do festival a qualquer momento), e o único desejo era o de poder tomar um banho, o que infelizmente não era possível. Para outras pessoas, havia uma situação mais complicada. Devido à forte chuva, em algumas barracas havia entrado água. Isso aconteceu nas acomodações do Magnificent Greens, área do camping onde você leva a sua própria barraca. Algumas delas não aguentaram os ventos e acabaram entortando. Outras não deram conta da força da água e acabaram encharcando… São perrengues de festival num país com temperatura instável — e por isso é preciso escolher bem qual tenda adquirir ou reforçá-la com lonas e outros equipamentos.

Para nós, que apenas sonhávamos com um banho, restava passar lencinhos umedecidos no corpo para poder dormir com uma pequena sensação de limpeza, mitigando os danos para tentar uma noite tranquila de sono. E o pessoal não tinha vergonha, não. Lembra daqueles que não pagavam pelo banho? Pois então. Era muito comum você estar na pia escovando os dentes para deitar e ao seu lado uma pessoa lavando os pés sujos de barro na torneira. Ou até mesmo chinelos e roupas. 

Tomorrowland Brasil - Dreamville

Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Por isso, acampar é uma experiência na qual você tem que ir de cabeça aberta e pronta para vivenciar coisas que não fazem parte da sua rotina. E essa é realmente a graça de estar no camping: respeitar as diferenças culturais entre as pessoas, e, mais do que isso, normalizar ações dentro daquele contexto. Como uma observadora nata, este era meu passatempo favorito: ver como as pessoas estavam vivendo o Dreamville, fosse passando o tempo descansando na barraca ou curtindo um after com inúmeros desconhecidos com volume no talo de uma caixa de som.

Infelizmente (ou felizmente) sou daquelas que precisam deitar. Afinal, você passa o dia todo andando pelos diversos palcos do Tomorrowland (no meu caso, foram cerca de 18 quilômetros por dia), e quando termina, o ideal é descansar, porque no outro dia acontece tudo de novo. No sábado (12), o cansaço já batia na hora de levantar do colchão. A gente só saía da barraca porque o calor nos expulsava. Seguia a mesma rotina de banho. Desta vez, fomos nos banheiros feitos pela produção do evento. Ponto positivo: nessa estrutura havia suporte para os itens (ufa!) e água quentinha. O único defeito era que ficava bem próximo à parede.

Nesse dia, fomos à padaria do Dreamville para tomar um café e comer um misto-quente. Os itens nesse espaço variam de 1 a 2,5 pearls. A praça de alimentação era cercada por bancos com sombra e também havia food trucks com opção de comida, como yakissoba, estrogonofe, donuts e espetinho.

Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Ao lado, uma área onde eram feitas aulas de yoga (ótima opção para quem buscava o equilíbrio entre curtir a noite toda e meditar pela manhã) e um campo com rede para jogar vôlei (para aqueles com superdisposição). Entre as demais lojinhas, havia tabacaria, farmácia, estúdio de tatuagem, salão de beleza e loja de suprimentos para camping, além da loja oficial do próprio Tomorrowland, com coleção de roupas, bandeiras e objetos que eram o puro desejo de todos os presentes.

Vivemos novamente tudo o que o festival poderia nos proporcionar e caminhávamos para o domingo (13), o terceiro dia de festival para o público geral e o quarto para os campistas. O sol estava bem forte e o People of Tomorrow do Dreamville resolveu ocupar todos os espaços contemplados por sombra no camping. Não havia lugar sobrando, o que tornou os arredores da nossa barraca um verdadeiro parque, onde todos sentavam em toalhas, colchões infláveis ou cadeira de praia para simplesmente não fazer nada e aproveitar o tempo livre de descanso. 

Conhecendo inúmeras pessoas, descobrimos algumas lendas, como o caso da Carol, nome entoado por todos os cantos do Dreamville, que teve origem nas edições passadas (em 2015/16), e tem a ver com uma garota que se perdeu no camping. Sua amiga, preocupada, saiu gritando seu nome, mas ninguém a encontrava. Desde então, virou tradição gritar “Carol” em qualquer momento e em qualquer local. 

Tomorrowland Brasil - Dreamville

Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Ainda no domingo (13), muitas pessoas acampadas optaram por já desmontar a barraca e fazer as malas, assim poderiam voltar para casa quando o festival encerrasse os shows de seu último dia, às 00h50. Não foi nosso caso. Poderíamos ficar no Dreamville até o meio-dia de segunda-feira (14), e assim fizemos. Não quer dizer que foi a melhor opção, tá? Na verdade, nos arrependemos por conta do sol.

Acordamos cedo, tomamos banho sem nenhuma fila, tomamos nosso café e resolvemos descansar para desmontar a barraca. Essa não foi uma tarefa tão difícil: havia instruções na capa e as pessoas sempre davam orientações umas às outras. Então, bastava tirar as estacas do chão (sim, essa parte foi complicada), tirar os ferros e dobrar a tenda em formato de oito. Prontinho, tudo embalado. Mas o sol, meus amigos, estava castigando.

Com tudo guardado dentro da mala, inclusive o protetor solar, tivemos que caminhar o mesmo longo percurso para ir embora. Confesso que tivemos que fazer várias pausas. O peso das malas, que já era grande, se somava ao peso de levar a barraca embora (sim, você pode desmontá-la e levar para casa), adicionado ao peso do nosso cansaço de quatro dias de festival e ao peso dos raios de sol na nossa cabeça. Resultado: conseguimos sobreviver, levando as malas até a entrada (desta vez nos obrigamos a fazer tudo em uma viagem só) e nos esforçamos para caber tudo no carro. Deu certo. Em cerca de 1 hora e 30 minutos, chegamos em São Paulo.

Refletindo sobre toda essa jornada que vivemos no Dreamville para escrever este texto, em meio a tosses irritantes com a queda da minha imunidade, consigo entender a magia da experiência que vivemos durante quatro dias acampados no Tomorrowland Brasil. Ao pisar no festival, você é transportado para um universo guiado pelas batidas da música eletrônica e com um só lema: “live today, love tomorrow, unite forever”. É engraçado como essa energia acaba atingindo todos os presentes e balanceando a vibração do lugar, que emana esse senso de comunidade em torno do viver com paixão e união, celebrando o presente, mas sem deixar de pensar no futuro. Tudo isso permeado pela música.

Para quem já passou dos 30, não é fácil. Mas com certeza vale a pena. E faz querer voltar mais vezes. Quem sabe em 2025?

Vitória Zane

Jornalista curiosa que ama escrever, conhecer histórias, descobrir festivais e ouvir música.