Carlomano da Baviera
Carlomano (em alemão: Karlmann; em latim: Karlomannus; c. 830 – 22 de março de 880) foi um rei franco da dinastia carolíngia. Foi o filho mais velho do rei da Frância Oriental Luís, o Germânico (r. 817–876) e Ema (r. 843–876), filha de um conde bávaro. Seu pai tornou-o marquês da Panônia em 856, e com a morte de seu pai em 876, tornou-se rei da Baviera. Nomeado por Luís II da Itália (r. 844–875) como seu sucessor, o Reino da Itália foi tomado por seu tio Carlos, o Calvo (r. 840–877) em 875. Carlomano apenas conquistou-o em 877. Em 879, estava incapacitado, talvez por um AVC, e abdicou a Baviera à Luís, o Jovem (r. 876–882) e a Itália a Carlos, o Gordo (r. 876–888).
Carlomano da Baviera | |
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Iluminura de Carlomano num manuscrito do século XII | |
Rei da Baviera | |
Reinado | 28 de agosto de 876-879 |
Consorte de | Filha de Ernesto |
Antecessor(a) | Luís II |
Sucessor(a) | Luís III |
Rei da Itália | |
Reinado | 877–879 |
Predecessor(a) | Carlos II |
Sucessor(a) | Carlos III |
Nascimento | ca. 830 |
Morte | 22 de março de 880 |
Sepultado em | Altötting, Baviera |
Descendência | Arnulfo |
Pai | Luís II |
Mãe | Ema |
Vida
editarInício da vida
editarA data de nascimento de Carlomano é incerta, mas foi provavelmente em torno de 830.[1] Seu nome pode estar conectado a vontade de seu pai de governar a Alamânia à época da reunião de seu pai em Worms em 829; o primeiro carolíngio homônimo a governar o país em 741–48 subjugou-o aos francos.[2] Carlomano estava velho o suficiente para participar na guerra civil de 840–43, travada entre seu pai e tios, Lotário I (r. 817–855) e Carlos, o Calvo (r. 840–877).[3] Sua primeira aparição pública registrada é como líder de um exército de reforços da Baviera e Alamânia que levou a seu pai em Worms em 842. Ele subsequentemente liderou-o em batalha junto com seu pai e tio (Carlos) contra seu outro tio.[4] Era o começo de uma carreira guerreira. Notker, o Gago, que lamentou o declínio da dinastia uma geração depois, chamou-o "Carlomano, o Belicosíssimo" (em latim: bellicosissimus).[5]
Em outubro de 848, estava presente no concílio de seu pai em Ratisbona, onde o oficial eslavo (duque) Pribina foi recompensado por seu serviço em defender a fronteira bávara. Na carta confirmando a concessão, assinou primeiro entre os magnatas seculares (após os eclesiásticos).[6] Na década de 940, relacionou-se com a concubina Liutsuínda, filha do conde bávaro Ratoldo e cunhada do conde Sigiardo de Craichgau.[7] Foi sua primeira ação politicamente independente e confirma sua íntima conexão com a Baviera. Em torno de 850, Liutsuínda deu-lhe um filho, Arnulfo. Esse nome foi escolhido, pois era distintamente dinástico (o fundador da família carolíngia foi o bispo Arnulfo de Metz), e ainda assim nunca havia sido usado por um rei reinante, e foi então apropriado para um filho mais velho ilegítimo. A escolha do nome é a prova mais segura de que Liutsuínda e Carlomano não estavam legalmente casados.[8] Em torno de 860, Arnulfo e seu primo, Hugo, filho ilegítimo do irmão de Carlomano, Luís, estavam em Coblença na corte de seu avô, que provavelmente supervisionou sua educação militar e manteve-os para garantir o bom comportamento de seus pais.[7]
Guardião da fronteira sudeste
editarEm 856, Luís associou Carlomano a seu governo ao nomeá-lo prefeito da Marca da Panônia, a fronteira bávara defrontando a Grande Morávia e Panônia Inferior.[3] Ele não lhe deu a sede tradicional em Tulln na Panônia, mas segundo os Anais de Fulda (863), deu-lhe o título de "prefeito dos carantanos" (em latim: praelatus Carantanis) e colocou-o mais ao sul, em região mais periférica, talvez como forma de impedir que tentasse tomar o poder de seu pai.[5] De 857 em diante, Carlomano e seu irmão foram testemunhas ocasionais das cartas de seu pai. Em 862, Carlomano revoltou-se e tentou estender seus domínios, mas foi derrotado.[9] Em 865, a partilha da Frância Oriental "em linhas étnicas"[10] que Luís estava preparando foi divulgada em Francoforte: seus três filhos receberam porções de importância junto das fronteiras e foram casados com a aristocracia local das regiões a eles designadas.[9][11]
Carlomano casou-se com a filha de um líder militar bávaro (duque) chamado Ernesto, que os Anais de São Bertino descrevem como "o maior de todos os grandes homens do rei".[9][11] Esse casamento deve ter ocorrido antes da desgraça e demissão de Ernesto em 861, pois Luís fortemente desaprovou seu segundo filho a procurar um casamento numa família que igualmente foi desgraçada em 858–59.[12] Carlomano não recebeu o título de rei durante a vida de seu pai, e o último reteve o controle sobre os bispados, contados terras fiscais e e importantes casos judiciais.[9] A carta de Carlomano para seu pai em 869 sobreviveu, descrevendo as condições da fronteira.[13] Por volta de década de 870, segundo os Anais de São Bertino, Ema encorajou seu marido a favorecê-lo em detrimento de seus irmãos. Isso é o primeiro envolvimento registrado de Ema na política, e pode estar relacionado a doença de Luís durante 869–70. Por outro lado, o historiador Ernst Dümmler pensou que Carlomano pode ter sido um "filhinho da mamãe" (Muttersöhnchen).[14]
Governante da Itália
editarEm 12 de agosto de 875, Luís II da Itália (r. 844–875) morreu e seu reino foi reclamado por Luís, para seus filhos Carlomano e Carlos; e por Carlos, o Calvo. O Papa João VIII (r. 872–882), lidando com a constante ameaça das invasões da Sicília muçulmana, ficou com Carlos, o Calvo. Carlomano liderou um exército à Itália, onde conferiu um diploma à Abadia de São Clemente, uma das casas mais favorecida de Luís II. No diploma, Carlomano declarou-se o sucessor escolhido de Luís.[15] Segundo os Anais de Fulda, Carlos ofereceu-o "grande soma em ouro e prata e pedras preciosas" para fazê-lo deixar a Itália. Em 28 de agosto de 876, Luís morreu e seus filhos tornaram-se reis em seus reinos atribuídos. Em 6 de outubro de 877, Carlos, o Calvo morreu e mais tarde naquele mês Carlomano conseguiu ser eleito rei da Itália pelos nobres reunidos em Pávia. A atração pela Itália era "o saque que aparentemente era aceitável quando um rei assumiu um reino", fornecendo recompensas que poderiam ser compartilhados com seus apoiantes e mais do que compensar o custo de criar um exército e cruzar os Alpes.[16][17] Carlomano foi um dos únicos dois reis carolíngios a Itália — seu irmão e sucessor Carlos foi o outro — que não emitiram um capitular no começo de seu reinado a fim de proclamar sua legitimidade e afirmar sua manutenção às tradições do bom governo.[18]
Na Itália confirmou o ato de seu predecessor que fez bispos missi dominici (representantes reais) permanentes em suas dioceses. Ele acrescentou novo regulamento expandindo a jurisdição dos bispos para obter lealdade.[19] Sua concessão ao bispo Guibodo de Parma do districtio, ou autoridade temporal no distrito fora das muralhas da cidade, foi a primeira concessão desse tipo para um bispo.[20] Pelo tempo da morte de Carlomano, a confirmação das concessões de seu predecessor ao episcopado e negociação de novas em troca de apoio tornaram-se tradição italiana.[19] Em 876, Carlos concedeu a João III direitos jurisdicionais nos ducados de Espoleto e Camerino. Depois de sua sucessão, Carlomano apoiou os duques Lamberto I (r. 859–871 e 876–880) e Guido III (r. 880–894) que reclamaram os direitos como representantes reais que Carlos ofereceu ao papa.[21]
Em 879 Carlomano doou terras ao Mosteiro de Santa Cristina pelo palácio real de Olona. Embora foi relatadamente construído durante o século VIII, o primeiro registro de sua dedicação a Cristina é encontrado em uma carta de Carlomano.[22] Numa carta de 7 de junho de 879, João III, não conseguindo convencer Luís, o Gago, herdeiro de Carlos, o Calvo, a vir a Itália a sua defesa, apelou para Carlomano, a quem rejeitou antes.[15] Mas já era tarde, pois à época Carlomano estava incapacitado. Pouco depois de sua abdicação, conferiu um conjunto de propriedades em torno de Olona à Igreja de São Sisto, fundada pela rainha Engelberga em Placência.[22] Na Itália, também emitiu dinheiros em Milão e Pávia; as emitidos em Milão geralmente portavam a inscrição Rei Carlomano (CARLOMAN REX), enquanto as de Pávia a inscrição HCARLEMANNVS RE. Todos tinham um templo estilizado em um lado; Carlomano não cunhou na Baviera.[17]
Governante da Baviera
editarNa Baviera, Carlomano refundou o palácio e mosteiro em Ötting.[23] Ele dedicou-a a Virgem Maria e "numerosos outros santos cujas relíquias eles foram capazes de coletar com ajuda de Deus".[14] Ele nomeou o amigo de seu pi, o estudioso linguístico Baldão, como seu chanceler.[24] Em 878, pode ter sido objeto de uma tentativa de assassinato.[25] Segundo os Anais de Salzburgo, o rei "estava cercado pelo conde Ermemberto e alguns de seus soldados" em Ergolding, mas o conde aparentemente fugiu à Frância Ocidental, onde foi recebido por Luís, o Gago.
Carlomano preparou seu filho ilegítimo Arnulfo para a sucessão na Baviera. Em uma carta emitida em Ratisbona, chamou-o "filho régio" (filius regalis), um termo similar a "o filho do rei" (filius regis), que era o título padrão de um filho real legítimo. Essa política teve apoio, como do abade Reginão de Prüm e dos monge de São Galo, mas também detratatores, que apelaram a seu irmão Luís.[26] No começo de 879, Carlomano foi incapacitado por uma enfermidade, possivelmente um AVC. Luís foi a Baviera para receber o reconhecimento da aristocracia como futuro rei.[27] Partiu por volta da páscoa e Arnulfo tomou controle do reino em nome do pai. Removeu alguns condes proeminentes, que apelaram para Luís restaurá-los. Carlomano tentou legitimar as ações de Arnulfo adicionando o nome de seu filho na oração presente em suas cartas, mas em novembro Luís foi a Baviera para forçar uma resolução da sucessão. Ele restaurou os condes depostos e Carlomano formalmente abdicou seu trono bávaro para seu irmão. Também colocou Arnulfo sob proteção de Luís.[26] Seu irmão Carlos datou seu reinado na Itália a partir de novembro de 879, então Carlomano presumivelmente abdicou daquele reino ao mesmo tempo que na Baviera.[28]
Enfermidade e morte
editarConcernente a condição de Carlomano, os Anais de Fulda (879) registraram que ele perdeu sua voz, mas ainda era capaz de comunicar-se escrevendo. Reginão, escrevendo em sua crônica em torno do ano 880, afirma que ele era "erudito em cartas" (litteris eruditus), o que significa que podia escrever em latim.[29] O encômio inteiro de Região sobre Carlomano afirma:
“ | O rei mais excelente era erudito em letras, devotado a religião cristã, justo, pacífico, e moralmente direto. A beleza de seu corpo era excepcional, e sua força física foi uma maravilha a contemplar. Ele possuía um espírito muito guerreiro. Ele travou inúmeras guerras com os reis eslavos com seu pai, e mesmo mais sem ele. Ele também retornou o vitorioso em triunfo e expandiu as fronteiras de seu império com ferro glorioso. Ele era moderado para seus próprios homens e um terror vívido a seus inimigos. Ele era encantador no discurso, humilde, e dotado de grande inteligência para gerir os assuntos do reino. Ele era tão habilidoso que era a própria encarnação da majestade real.[5] | ” |
Muitas fontes colocam sua morte em março de 880, mas os Anais de Salzburgo colocam-a em 21 de setembro. Ele foi sepultado numa capela em seu palácio em Ötting.[30] Carlomano deixou um filho ilegítimo, Arnulfo, que continuou como marquês da Caríntia durante os reinados dos irmãos de Carlomano,[31] mas em 887 tornou-se rei da Frância Oriental e em 896 como imperador.
Ancestrais
editarVer também
editarCarlomano da Baviera Nascimento: 830 Morte: 22 de março de 880
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Títulos reais | ||
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Precedido por: Luís II como Rei da Frância oriental |
Rei da Baviera 876–880 |
Sucedido por: Luís III como Rei da Saxônia |
Precedido por: Carlos II |
Rei da Itália 877–879 |
Sucedido por: Carlos III |
Referências
- ↑ Schieffer 1977.
- ↑ Goldberg 2006, p. 60–61.
- ↑ a b Reuter 1991, p. 72.
- ↑ Goldberg 2006, p. 107.
- ↑ a b c Goldberg 2006, p. 247.
- ↑ Goldberg 2006, p. 142, 156.
- ↑ a b Goldberg 2006, p. 264–65.
- ↑ Goldberg 2006, p. 265 n. 3.
- ↑ a b c d Reuter 1991, p. 73.
- ↑ Reuter 1991, p. 92.
- ↑ a b Goldberg 2006, p. 267.
- ↑ Reuter 1991, p. 76.
- ↑ Reuter 1991, p. 90.
- ↑ a b Goldberg 2006, p. 305.
- ↑ a b Engreen 1945, p. 325.
- ↑ Reuter 1991, p. 75.
- ↑ a b Grierson 1986, p. 227 e 253.
- ↑ MacLean 2010, p. 399.
- ↑ a b MacLean 2010, p. 407.
- ↑ MacLean 2003, p. 91–92.
- ↑ MacLean 2010, p. 412.
- ↑ a b MacLean 2003, p. 94.
- ↑ Reuter 1991, p. 87.
- ↑ Goldberg 2006, p. 183.
- ↑ Reuter 1991, p. 116.
- ↑ a b MacLean 2003, p. 134–36.
- ↑ Reuter 1991, p. 83.
- ↑ MacLean 2010, p. 147.
- ↑ Goldberg 2006, p. 210 n. 127.
- ↑ MacLean 2003, p. 141.
- ↑ Reuter 1991, p. 117.
Bibliografia
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- Engreen, Fred E. (1945). «Pope John the Eighth and the Arabs». Speculum. 20 (3): 318–30. doi:10.2307/2854614
- Goldberg, Eric Joseph (2006). Struggle for Empire: Kingship and Conflict Under Louis the German, 817–876. Ítaca, Nova Iorque: Cornell University Press
- Grierson, Philip; Blackburn, Mark (1986). Medieval European Coinage, With a Catalogue of the Coins in the Fitzwilliam Museum, Volume 1: The Early Middle Ages (5th–10th Centuries). Cambridge: Cambridge University Press
- MacLean, Simon (2003). Kingship and Politics in the Late Ninth Century: Charles the Fat and the End of the Carolingian Empire. Cambridge: Cambridge University Press
- MacLean, Simon (2010). «Legislation and Politics in Late Carolingian Italy: The Ravenna Constitutions». Early Medieval Europe. 18: 394–416. doi:10.1111/j.1468-0254.2010.00304.x
- Reuter, Timothy (1991). Germany in the Early Middle Ages, c. 800–1050. Londres: Longman
- Riezler, Sigmund von (1882). «Karlmann. König von Baiern und von Italien». Allgemeine Deutsche Biographie. 15. Lípsia: Duncker und Humblot. pp. 397–400
- Schieffer, Theodor (1977). «Karlmann». Neue Deutsche Biographie. 11. Berlim: Duncker und Humblot